25.1.09
Leituras Ociosas
Como já tenho confessado noutras ocasiões, debato-me com o problema angustiante de possuir farta biblioteca, para a minha escala e posses, evidentemente, e escasso tempo para tirar proveito dos seus enormes benefícios.
Tenho-a repartida por vários locais e, com frequência, transporto livros de um para outro lado, consoante as prioridades do momento.
Isto tem inconvenientes óbvios. Quando penso que nem tão depressa vou precisar de ler este ou aquele livro, removo-o da minha proximidade. Passado pouco tempo, porém, logo me surge a necessidade de o consultar, por qualquer motivo prático inesperado ou por mera saudade da sua fruição.
Sofre esta dura pena, quem muito gosta de livros e os acumula desde a adolescência, aquela fase da absoluta voracidade de conhecimento, em que as preferências se multiplicam e se entrechocam, dificultando a fixação dos nossos interesses.
Hoje, o problema do discernimento dos interesses está em grande parte ultrapassado. Mas sobreveio outra aflição: a absoluta falta de tempo para ler e apreender tudo aquilo que estes numerosos nossos amigos, que são os livros, contêm.
Lá se acham depositados alguns verdadeiros tesouros, postos por gente muito diversa, que despendeu o seu precioso tempo para no-los oferecer e ali estão, generosa e pacientemente, à espera da nossa visita, em muitos casos obrigatoriamente demorada, e daí o problema do tempo, que só tem um sentido para nós.
A partir de certa faixa etária, começamos mesmo a sentir, com plena acuidade, a sua mais cruel característica, a da sua progressiva, inexorável exaustão, com tanta coisa ainda por descobrir, outras por rememorar, para de novo as fruir.
São estes, creio, sentimentos típicos de quem nasceu na era da cultura ainda principalmente exaurida nos livros.
Admito que hoje, na voragem da internet e do audiovisual, para as gerações mais moças, esta relação afectuosa com o livro tenha diminuído um tanto. Mas, igualmente creio, que sempre haverá quem leia por gosto, muito e variadamente, com inclinação algo omnívora, quanto a temas e autores, dando continuação a esta raça, para alguns exótica, dos que empregam grande parte do seu exíguo tempo, no longo comércio com os livros, como dizia Montaigne, insigne exemplo de leitor-escritor, binómio amiúde indissociável.
Pode a muitos espíritos, porventura mais práticos, parecer desperdício este modo de gastar o limitado tempo de cada um em leituras de puro ócio e gozo chão, sobretudo numa época que elegeu a busca de riqueza como principal, se não único objectivo de vida.
Mas asseguro que ele tem também as suas compensações e uma delas, não despicienda, é livrar-nos das ciladas desse maganão, como lhe chamava o nosso suave João de Deus, como também, muito antes dele, nos preveniu, aqui ao lado, o sábio Arcipreste de Hita, no seu famoso «Libro de Buen Amor» e outro seu compatriota, o esclarecido Quevedo, no conhecido poema «Poderoso Caballero», que a voz inspirada de Paco Ibanez ajudou a divulgar, há um ror de anos, noutra encarnação, quando todos estes males do dinheiro nos pareciam simples de sanar.
Para avivar a nossa memória, deixo aqui os três citados poemas que virão certamente muito a propósito, no momento actual :
O Dinheiro
O dinheiro é tão bonito,
Tão bonito, o maganão!
Tem tanta graça, o maldito,
Tem tanto chiste, o ladrão!
O falar, fala de um modo...
Todo ele, aquele todo...
E elas acham-no tão guapo!
Velhinha ou moça que veja,
Por mais esquiva que seja,
Tlim!
Papo.
E a cegueira da justiça
Como ele a tira num ai!
Sem lhe tocar com a pinça;
É só dizer-lhe: «Aí vai...»
Operação melindrosa,
Que não é lá qualquer coisa;
Catarata, tome conta!
Pois não faz mais do que isto,
Diz-me um juiz que o tem visto:
Tlim!
Pronta.
Nessas espécies de exames
Que a gente faz em rapaz,
São milagres aos enxames
O que aquele demo faz!
Sem saber nem patavina
De gramática latina,
Quer-se um rapaz dali fora?
Vai ele com tais falinhas,
Tais gaifonas, tais coisinhas...
Tlim!
Ora...
Aquela fisionomia
É lábia que o demo tem!
Mas numa secretaria
Aí é que é vê-lo bem!
Quando ele de grande gala,
Entra o ministro na sala,
Aproveita a ocasião:
«Conhece este amigo antigo?»
- Oh, meu tão antigo amigo!
(Tlim!)
Pois não!
João de Deus ( 1830 – 1896 )
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Tenho-a repartida por vários locais e, com frequência, transporto livros de um para outro lado, consoante as prioridades do momento.
Isto tem inconvenientes óbvios. Quando penso que nem tão depressa vou precisar de ler este ou aquele livro, removo-o da minha proximidade. Passado pouco tempo, porém, logo me surge a necessidade de o consultar, por qualquer motivo prático inesperado ou por mera saudade da sua fruição.
Sofre esta dura pena, quem muito gosta de livros e os acumula desde a adolescência, aquela fase da absoluta voracidade de conhecimento, em que as preferências se multiplicam e se entrechocam, dificultando a fixação dos nossos interesses.
Hoje, o problema do discernimento dos interesses está em grande parte ultrapassado. Mas sobreveio outra aflição: a absoluta falta de tempo para ler e apreender tudo aquilo que estes numerosos nossos amigos, que são os livros, contêm.
Lá se acham depositados alguns verdadeiros tesouros, postos por gente muito diversa, que despendeu o seu precioso tempo para no-los oferecer e ali estão, generosa e pacientemente, à espera da nossa visita, em muitos casos obrigatoriamente demorada, e daí o problema do tempo, que só tem um sentido para nós.
A partir de certa faixa etária, começamos mesmo a sentir, com plena acuidade, a sua mais cruel característica, a da sua progressiva, inexorável exaustão, com tanta coisa ainda por descobrir, outras por rememorar, para de novo as fruir.
São estes, creio, sentimentos típicos de quem nasceu na era da cultura ainda principalmente exaurida nos livros.
Admito que hoje, na voragem da internet e do audiovisual, para as gerações mais moças, esta relação afectuosa com o livro tenha diminuído um tanto. Mas, igualmente creio, que sempre haverá quem leia por gosto, muito e variadamente, com inclinação algo omnívora, quanto a temas e autores, dando continuação a esta raça, para alguns exótica, dos que empregam grande parte do seu exíguo tempo, no longo comércio com os livros, como dizia Montaigne, insigne exemplo de leitor-escritor, binómio amiúde indissociável.
Pode a muitos espíritos, porventura mais práticos, parecer desperdício este modo de gastar o limitado tempo de cada um em leituras de puro ócio e gozo chão, sobretudo numa época que elegeu a busca de riqueza como principal, se não único objectivo de vida.
Mas asseguro que ele tem também as suas compensações e uma delas, não despicienda, é livrar-nos das ciladas desse maganão, como lhe chamava o nosso suave João de Deus, como também, muito antes dele, nos preveniu, aqui ao lado, o sábio Arcipreste de Hita, no seu famoso «Libro de Buen Amor» e outro seu compatriota, o esclarecido Quevedo, no conhecido poema «Poderoso Caballero», que a voz inspirada de Paco Ibanez ajudou a divulgar, há um ror de anos, noutra encarnação, quando todos estes males do dinheiro nos pareciam simples de sanar.
Para avivar a nossa memória, deixo aqui os três citados poemas que virão certamente muito a propósito, no momento actual :
O Dinheiro
O dinheiro é tão bonito,
Tão bonito, o maganão!
Tem tanta graça, o maldito,
Tem tanto chiste, o ladrão!
O falar, fala de um modo...
Todo ele, aquele todo...
E elas acham-no tão guapo!
Velhinha ou moça que veja,
Por mais esquiva que seja,
Tlim!
Papo.
E a cegueira da justiça
Como ele a tira num ai!
Sem lhe tocar com a pinça;
É só dizer-lhe: «Aí vai...»
Operação melindrosa,
Que não é lá qualquer coisa;
Catarata, tome conta!
Pois não faz mais do que isto,
Diz-me um juiz que o tem visto:
Tlim!
Pronta.
Nessas espécies de exames
Que a gente faz em rapaz,
São milagres aos enxames
O que aquele demo faz!
Sem saber nem patavina
De gramática latina,
Quer-se um rapaz dali fora?
Vai ele com tais falinhas,
Tais gaifonas, tais coisinhas...
Tlim!
Ora...
Aquela fisionomia
É lábia que o demo tem!
Mas numa secretaria
Aí é que é vê-lo bem!
Quando ele de grande gala,
Entra o ministro na sala,
Aproveita a ocasião:
«Conhece este amigo antigo?»
- Oh, meu tão antigo amigo!
(Tlim!)
Pois não!
João de Deus ( 1830 – 1896 )
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Poderoso caballero es don Dinero
Madre, yo al oro me humillo,
él es mi amante y mi amado,
pues de puro enamorado
de continuo anda amarillo.
Que pues doblón o sencillo
hace todo cuanto quiero,
poderoso caballero
es don Dinero.
Nace en las Indias honrado,
donde el mundo le acompaña;
viene a morir en España,
y es en Génova enterrado.
Y pues quien le trae al lado
es hermoso, aunque sea fiero,
poderoso caballero
es don Dinero.
Es galán, y es como un oro:
tiene quebrado el color;
persona de gran valor,
tan cristiano como moro;
que pues da y quita el decoro
y quebranta cualquier fuero,
poderoso caballero
es don dinero.
Son sus padres principales,
y es de nobles descendiente,
porque en las venas de Oriente
todas las sangres son reales.
Y pues es quien hace iguales
al duque y al ganadero,
poderoso caballero
es don Dinero.
Por importar en los tratos
y dar tan buenos consejos
en las casas de los viejos
gatos le guardan de gatos;
y, pues él rompe recatos
y ablanda al juez más severo,
poderoso caballero
es don dinero.
Nunca vi damas ingratas
a su gusto y afición,
que a las caras de un doblón
hacen sus caras baratas;
y pues hace las bravatas
desde una bolsa de cuero,
poderoso caballero
es don dinero.
Francisco de Quevedo (1580-1645)
Madre, yo al oro me humillo,
él es mi amante y mi amado,
pues de puro enamorado
de continuo anda amarillo.
Que pues doblón o sencillo
hace todo cuanto quiero,
poderoso caballero
es don Dinero.
Nace en las Indias honrado,
donde el mundo le acompaña;
viene a morir en España,
y es en Génova enterrado.
Y pues quien le trae al lado
es hermoso, aunque sea fiero,
poderoso caballero
es don Dinero.
Es galán, y es como un oro:
tiene quebrado el color;
persona de gran valor,
tan cristiano como moro;
que pues da y quita el decoro
y quebranta cualquier fuero,
poderoso caballero
es don dinero.
Son sus padres principales,
y es de nobles descendiente,
porque en las venas de Oriente
todas las sangres son reales.
Y pues es quien hace iguales
al duque y al ganadero,
poderoso caballero
es don Dinero.
Por importar en los tratos
y dar tan buenos consejos
en las casas de los viejos
gatos le guardan de gatos;
y, pues él rompe recatos
y ablanda al juez más severo,
poderoso caballero
es don dinero.
Nunca vi damas ingratas
a su gusto y afición,
que a las caras de un doblón
hacen sus caras baratas;
y pues hace las bravatas
desde una bolsa de cuero,
poderoso caballero
es don dinero.
Francisco de Quevedo (1580-1645)
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Lo que puede el dinero
Hace mucho el dinero, mucho se le ha de amar;
Al torpe hace discreto, hombre de respetar,
hace correr al cojo al mudo le hace hablar;
el que no tiene manos bien lo quiere tomar.
También al hombre necio y rudo labrador
dineros le convierten en hidalgo doctor;
Cuanto más rico es uno, más grande es su valor,
quien no tiene dinero no es de sí señor.
Y si tienes dinero tendrás consolación,
placeres y alegrías y del Papa ración,
comprarás Paraíso, ganarás la salvación:
donde hay mucho dinero hay mucha bendición.
El crea los priores, los obispos, los abades,
arzobispos, doctores, patriarcas, potestades
a los clérigos necios da muchas dignidades,
de verdad hace mentiras, de mentiras hace verdades.
El hace muchos clérigos y mucho ordenados,
muchos monjes y monjas, religiosos sagrados,
el dinero les da por bien examinados,
a los pobres les dicen que no son ilustrados.
Yo he visto a muchos curas en sus predicaciones,
despreciar el dinero, también sus tentaciones,
pero, al fin, por dinero otorgan los perdones,
absuelven los ayunos y ofrecen oraciones.
Dicen frailes y clérigos que aman a Dios servir,
más si huelen que el rico está para morir,
y oyen que su dinero empieza a retiñir,
por quién ha de cogerlo empiezan a reñir.
En resumen lo digo, entiéndelo mejor,
el dinero es del mundo el gran agitador,
hace señor al siervo y siervo hace al señor,
toda cosa del siglo se hace por su amor.
Arcipreste de Hita ( Sec. XIV)
AV_Lisboa, 24 de Janeiro de 2009
12.1.09
Pequena Evocação de Cruz Malpique
Este fim-de-semana passei-o, em grande parte, na companhia de Cruz Malpique, lendo a obra «O Homem, Centro do Mundo», um dos três livros que dele tenho aqui comigo e que periodicamente releio.
Os outros dois são «Higiene Intelectual e Moral do Estudante» e «Ensaio sobre o Homem de Ciência», todos livros escritos na década de 30 do século passado.
Recordo que o primeiro livro que dele li foi «Higiene Intelectual e Moral do Estudante», espécie de manual de orientação juvenil, elaborado no desejo de guiar a Mocidade de então para ideais sãos, elevados, numa fase em que os idealismos podem atrair as suas mentes, ao mesmo tempo que outras solicitações mais rasteiras, mas sedutoras, as podem vir a desencaminhar.
Comprei-o numa barraca livreira que existia ali à entrada do antigo Parque Mayer, em que se vendiam livros, restos de edições, julgo que a vinte e cinco tostões e a cinco escudos cada, montantes modestos, acessíveis, na minha adolescência, cerca de um quarto a metade do preço de um 2º balcão, para uma matinée, ali ao lado, no imponente S. Jorge dos grandes filmes em écran gigante, no final da década de 60, início da de 70, em plena primavera marcelista, então deveras esperançosa.
Lembro-me que o homem que lá se encontrava anunciava o preço dos livros, em voz alta, terminando sempre com uma frase típica, para sublinhar a oportunidade da aquisição : «… Não paga o papel !».
Este autor, Cruz Malpique, então para mim completamente desconhecido, era Professor de Filosofia, na altura, já do Liceu Alexandre Herculano, no Porto, depois de ter passado pelos de Gil Vicente e de Pedro Nunes, em Lisboa e pelos Liceus de Faro, Angra do Heroísmo e Salvador Correia de Sá, em Luanda, tendo chegado a ser Reitor deste último.
Escreveu bastante Cruz Malpique, mas hoje nenhum dos seus livros se encontra disponível no Mercado, apesar do interesse das matérias que neles tratava, sempre de forma elevada, altiva, exigente com o leitor, puxando por ele, apelando ao que de mais nobre ele possa encerrar dentro de si, para o motivar a qualquer actividade útil, para si e para a colectividade em que vive.
Definia-se como um escritor de forte personalidade humanística, crente na boa índole humana, desde que oportunamente suscitada com exemplos adequados e depois convenientemente orientada e exercitada.
Havendo regressado a Portugal em 1947, radicou-se no Porto, aí continuando a leccionar até 1984, vindo a morrer, com 90 anos, nesta mesma cidade, em 1992, longe da sua terra natal, Nisa, que o soube honrar, ainda em vida, em 1987, atribuindo-lhe a Medalha de Mérito Municipal e promovendo uma sessão de evocação da sua vida e obra em 1993, com a presença de suas duas filhas.
No Liceu Alexandre Herculano, a que doou a sua biblioteca pessoal, existe uma sala com o seu nome, como reconhecimento do seu largo e profícuo desempenho como Professor de Filosofia ali exercido.
Na fosse a existência de um blogue com o nome do Concelho de Nisa e nem uma pequena nota hoje existiria da sua passagem pela Terra, apesar do vasto labor nela produzido, em significativa obra literária deixada, com mais de 200 títulos publicados, infelizmente nenhum deles, como referi, actualmente no Mercado.
Em contrapartida, não faltam, neste aparentemente próspero Mercado, porque tão altamente produtivo, toneladas de publicações, na maior parte, historietas da mais vulgar banalidade, consumidas por públicos ávidos de leitura, mas, surpreendentemente, pouco escrupulosos nas suas escolhas.
Nenhum editor se lembrou ainda de repescar do esquecimento este excelso e afinal prolífico autor, além de nobre cidadão, dedicado à causa da participação democrática esclarecida.
Por ele, na minha adolescência, conheci muitos outros autores nacionais e estrangeiros, abundantemente citados em qualquer das suas obras, por vezes com extensas citações e comentários, para elucidação dos seus pontos de vista.
Dada a sua vasta formação intelectual, licenciado em Direito e em Letras, era largo o espectro das citações. Nas letras pátrias, Fernão Lopes, Gil Vicente, Camões, Vieira, Bernardes, Herculano, Garrett, Antero, Eça, O. Martins, Raul Brandão, Aquilino Ribeiro, Egas Moniz, dominavam as suas referências; nas outras, desde os pré-Socráticos, aos clássicos greco-latinos, como Sócrates, Platão, Diógenes, Ésquilo, Sófocles, Pitágoras, Arquimedes, a Cícero, Virgílio, Marcial, Séneca, aos medievos Santo Agostinho, Tomás de Aquino, aos renascentistas Petrarca, Dante, Boccacio, Erasmo, Da Vinci, Kepler, Galileu, aos modernos Newton, Leibniz, Montaigne, Descartes, Pascal, aos romancistas Stendhal, Hugo, Balzac, Zola, aos enciclopedistas franceses D’Alembert, Diderot, Voltaire, Rosseau, aos escritores ingleses Shakespeare, Defoe, Dickens, aos alemães Goethe, Schiller, Mann, com especial atenção para os filósofos, Kant e Nietzsche, aos espanhóis Cervantes, Ortega y Gasset, Maranon, Unamuno, toda uma plêiade de pensadores que fizeram avançar a Humanidade, achavam lugar destacado nas suas obras de profunda reflexão, traço típico do grande escritor humanista que Cruz Malpique foi.
Como se explica que certos nomes tão ilustres como este permaneçam praticamente desconhecidos da esmagadora maioria do povo português ?
Que fazemos para os divulgar entre os nossos distraídos compatriotas ?
Aqui deixo estas notas rudimentares, na expectativa de que outros as multipliquem com mais elementos relativos à vida e obra deste insigne português, em risco de não se libertar da lei da morte, segundo o famoso critério de Camões, apesar das muitas «obras valerosas» que foi capaz de nos legar.
AV_Lisboa, 11 de Janeiro de 2009
5.1.09
Perspectiva de Ano Novo
Entrámos em 2009, com baixas expectativas. Mesmo os mais optimistas mostram agora alguma relutância em formular perspectivas animadoras, na economia e no resto, que, afinal, é muito, imenso, deixando-nos sempre campo suficiente para o exercício das nossas aptidões, desejavelmente desencadeadas pela imaginação criadora de que formos capazes.
A Comunicação Social geralmente tola e leviana repete a ladainha dos Economistas e dos Gestores, tão certeiros e fiáveis hoje, como o foram ontem, na proclamação de um mundo virtuoso de negócios sem fim e, deveriam também dizer, de preferência sem lei, para maximizar os seus lucros e os correspondentes êxitos sociais, medidos estes, invariavelmente, pelo volume daqueles.
Expulsa a Ética, ludibriada a Lei, ausentes a Religião ou qualquer outra entidade fornecedora de um quadro de valores, de referências morais claras e coerentes, o mundo dos negócios transforma-se numa selva, onde os mais aptos, espertos, ousados, frios e insaciáveis estabelecem o seu Reino, o seu Eldorado, vastamente admirado por inúmeras cortes estipendiadas para o efeito, que lhes vão permitindo a habitual impunidade.
Veremos se desta mais recente crise financeira especulativa voltam a safar-se os seus responsáveis, esses idolatrados magos da Gestão criativa, dela se retirando algum ensinamento válido para o futuro.
A Economia e a Gestão desligadas da realidade produtiva ao serviço da Comunidade tornam-se uma aberração. Mesmo sem confundir Empresas com Irmandades ou Confrarias, é preciso não perder de vista os fins da actividade económica.
Se a Economia não visar a satisfação das necessidades dos povos, antes privilegiando a multiplicação de numerário, sem a correspondente ligação com a vida real das populações, acabará por se desvirtuar, terminando numa fantasia contabilística, que, por mais habilidosa que se apresente, jamais criará algo de útil ou duradouro.
Muitas destas reflexões têm sido feitas nos últimos meses, por variados comentadores de diferentes orientações ideológicas, com predomínio óbvio das ditas de esquerda, radicais ou de extrema-esquerda, subitamente reanimados com o descalabro das teses do neo-liberalismo económico e financeiro, como se este legitimasse a posteriori o grande malogro do Comunismo, o maior embuste doutrinário de todas as utopias dos dois últimos séculos.
Numa altura em que muito se fala da formação de um novo partido político, regressam com despudorada ousadia os velhos mitos esquerdistas encarnados, por vezes, em mentes jovens, generosas, por hipótese, mas sumamente ingénuas e erradas na sua concepção das novas realidades políticas, económicas e sociais.
É verdade que o ambiente está maduro para o aparecimento de outras forças políticas, após a decepção gerada pelos dois partidos do centro político português – PS e PSD – que há cerca de trinta anos se alternam no Poder, iludindo alternativas, numa continuidade promíscua, geradora de clientelismos parasitas, pasto da incompetência e da corrupção da maioria dos seus líderes e quadros partidários.
Quando iniciei estas lides, a meio do ano de 2004, já me batia pela necessidade de se forjar uma alternativa política, no seio da área da Social-Democracia, que abarcasse eleitores e militantes daqueles dois partidos moderados, dada a sua descaracterização ideológica evidente, primeiro do PSD e depois do PS, como o «fenómeno socrático» se encarregou de demonstrar em pleno, se dúvidas restassem.
Vejo, no entanto, que as iniciativas ultimamente esboçadas nesse sentido se encaminham mais para a criação de um partido ou movimento radical do que para uma formação moderada, doutrinariamente sensata, capaz de incorporar os ensinamentos colhidos nas experiências políticas passadas, congraçando as conquistas sociais das sociedades europeias, dos trinta anos gloriosos do pós-Guerra, com a eficiência produtiva do Capitalismo, sistema económico, convém relembrar, que não colhe comparação com nenhum outro que a História até ao momento tenha revelado.
Se estas tendências radicais prevalecerem, uma parte do Partido Socialista, descontente e envergonhada com a política de Sócrates, aliar-se-á a um agrupamento radical, espaventoso e algo exótico, como o Bloco de Esquerda, onde impera um certo folclore ideológico, que o faz apoiar causas ditas fracturantes, de alcance minoritário na sociedade portuguesa, como o relativismo ético, o anti-americanismo exacerbado, até aqui disfarçado de anti-Bush, o pró-palestinianismo ou o anti-israelismo sem critério, o Castrismo, com Fidel ou com Raul, mas sempre sem Democracia, etc., etc.
Com esta composição, incluindo ou não pontuais alianças com os Comunistas, nada de bom se pode augurar, mesmo se lá figurarem pessoas inteligentes, bem intencionadas, competentes e sérias, que naturalmente sempre as haverá em qualquer formação política.
O centro político moderado continuará assim mal representado, acentuando o desinteresse de vastas camadas sociais pelo fenómeno político, cada vez mais descontentes com a actual governação socrática e com a falta de alternativa para a sua substituição.
Como se percebe, Sócrates e seus acólitos apostam neste possível enquadramento, que inequivocamente lhes preserva o espaço de manobra, apenas com o risco de perda de nova maioria absoluta.
Entretanto, todo o ambiente permanecerá inquinado: desde o Governo, ao Parlamento, a todas as Direcções-Gerais da Administração Pública aos Institutos a estas associados, aos órgãos reguladores da actividade económica, social e cultural : Banco de Portugal, Energia, Combustíveis, Telecomunicações, Concorrência Económica, Saúde, Comunicação Social, com o controlo da RDP, da RTP e um largo número de órgãos de imprensa, um interminável tecido de interesses sustentado por activa máquina de propaganda continuará a submeter o País à influência de uma dada família política, conhecida pela sua larga ausência de escrúpulos, no que se refere ao exercício do Poder.
Para contrariar este anómalo estado de coisas é absolutamente necessário forjar uma verdadeira alternativa política. Todavia, não pode ser o actual Presidente da República a fazer esse papel, ainda que lhe caiba a importante missão de conter os devaneios e os excessos socráticos, exercendo uma apertada vigilância nos actos do Governo, exigindo o cumprimento da normas constitucionais, as quais, na verdade, jurou defender, cumprir e fazer cumprir.
Veremos se a chamada sociedade civil conseguirá sair da presente letargia, que tanta desmotivação vai produzindo, tanto fatalismo, conformismo e, por fim, geral submissão, afogando as esperanças de todos numa regeneração política, sempre evocada, mas constantemente adiada.
Ânimo, pois, para todos os Portugueses de são juízo e de firme carácter, neste ano de 2009, que, nem por se apresentar tão pouco auspicioso, deve ser tomado sem esperança, antes mais uma razão ele nos dá para suscitar a imaginação, a aplicação no trabalho e a vontade de enfrentar e vencer as dificuldades que se avizinham.
Basta lembrar que atrás do tempo, tempo vem.
No fundo, se este vai ser um ano difícil, sempre poderemos perguntar para quem foi fácil o ano que findou, excluindo obviamente a consabida casta financeira que bem democraticamente se tem regalado com a desregulação económica, até há pouco erigida em condição suprema da competitividade das Empresas, no mundo inteiro ?
A Comunicação Social geralmente tola e leviana repete a ladainha dos Economistas e dos Gestores, tão certeiros e fiáveis hoje, como o foram ontem, na proclamação de um mundo virtuoso de negócios sem fim e, deveriam também dizer, de preferência sem lei, para maximizar os seus lucros e os correspondentes êxitos sociais, medidos estes, invariavelmente, pelo volume daqueles.
Expulsa a Ética, ludibriada a Lei, ausentes a Religião ou qualquer outra entidade fornecedora de um quadro de valores, de referências morais claras e coerentes, o mundo dos negócios transforma-se numa selva, onde os mais aptos, espertos, ousados, frios e insaciáveis estabelecem o seu Reino, o seu Eldorado, vastamente admirado por inúmeras cortes estipendiadas para o efeito, que lhes vão permitindo a habitual impunidade.
Veremos se desta mais recente crise financeira especulativa voltam a safar-se os seus responsáveis, esses idolatrados magos da Gestão criativa, dela se retirando algum ensinamento válido para o futuro.
A Economia e a Gestão desligadas da realidade produtiva ao serviço da Comunidade tornam-se uma aberração. Mesmo sem confundir Empresas com Irmandades ou Confrarias, é preciso não perder de vista os fins da actividade económica.
Se a Economia não visar a satisfação das necessidades dos povos, antes privilegiando a multiplicação de numerário, sem a correspondente ligação com a vida real das populações, acabará por se desvirtuar, terminando numa fantasia contabilística, que, por mais habilidosa que se apresente, jamais criará algo de útil ou duradouro.
Muitas destas reflexões têm sido feitas nos últimos meses, por variados comentadores de diferentes orientações ideológicas, com predomínio óbvio das ditas de esquerda, radicais ou de extrema-esquerda, subitamente reanimados com o descalabro das teses do neo-liberalismo económico e financeiro, como se este legitimasse a posteriori o grande malogro do Comunismo, o maior embuste doutrinário de todas as utopias dos dois últimos séculos.
Numa altura em que muito se fala da formação de um novo partido político, regressam com despudorada ousadia os velhos mitos esquerdistas encarnados, por vezes, em mentes jovens, generosas, por hipótese, mas sumamente ingénuas e erradas na sua concepção das novas realidades políticas, económicas e sociais.
É verdade que o ambiente está maduro para o aparecimento de outras forças políticas, após a decepção gerada pelos dois partidos do centro político português – PS e PSD – que há cerca de trinta anos se alternam no Poder, iludindo alternativas, numa continuidade promíscua, geradora de clientelismos parasitas, pasto da incompetência e da corrupção da maioria dos seus líderes e quadros partidários.
Quando iniciei estas lides, a meio do ano de 2004, já me batia pela necessidade de se forjar uma alternativa política, no seio da área da Social-Democracia, que abarcasse eleitores e militantes daqueles dois partidos moderados, dada a sua descaracterização ideológica evidente, primeiro do PSD e depois do PS, como o «fenómeno socrático» se encarregou de demonstrar em pleno, se dúvidas restassem.
Vejo, no entanto, que as iniciativas ultimamente esboçadas nesse sentido se encaminham mais para a criação de um partido ou movimento radical do que para uma formação moderada, doutrinariamente sensata, capaz de incorporar os ensinamentos colhidos nas experiências políticas passadas, congraçando as conquistas sociais das sociedades europeias, dos trinta anos gloriosos do pós-Guerra, com a eficiência produtiva do Capitalismo, sistema económico, convém relembrar, que não colhe comparação com nenhum outro que a História até ao momento tenha revelado.
Se estas tendências radicais prevalecerem, uma parte do Partido Socialista, descontente e envergonhada com a política de Sócrates, aliar-se-á a um agrupamento radical, espaventoso e algo exótico, como o Bloco de Esquerda, onde impera um certo folclore ideológico, que o faz apoiar causas ditas fracturantes, de alcance minoritário na sociedade portuguesa, como o relativismo ético, o anti-americanismo exacerbado, até aqui disfarçado de anti-Bush, o pró-palestinianismo ou o anti-israelismo sem critério, o Castrismo, com Fidel ou com Raul, mas sempre sem Democracia, etc., etc.
Com esta composição, incluindo ou não pontuais alianças com os Comunistas, nada de bom se pode augurar, mesmo se lá figurarem pessoas inteligentes, bem intencionadas, competentes e sérias, que naturalmente sempre as haverá em qualquer formação política.
O centro político moderado continuará assim mal representado, acentuando o desinteresse de vastas camadas sociais pelo fenómeno político, cada vez mais descontentes com a actual governação socrática e com a falta de alternativa para a sua substituição.
Como se percebe, Sócrates e seus acólitos apostam neste possível enquadramento, que inequivocamente lhes preserva o espaço de manobra, apenas com o risco de perda de nova maioria absoluta.
Entretanto, todo o ambiente permanecerá inquinado: desde o Governo, ao Parlamento, a todas as Direcções-Gerais da Administração Pública aos Institutos a estas associados, aos órgãos reguladores da actividade económica, social e cultural : Banco de Portugal, Energia, Combustíveis, Telecomunicações, Concorrência Económica, Saúde, Comunicação Social, com o controlo da RDP, da RTP e um largo número de órgãos de imprensa, um interminável tecido de interesses sustentado por activa máquina de propaganda continuará a submeter o País à influência de uma dada família política, conhecida pela sua larga ausência de escrúpulos, no que se refere ao exercício do Poder.
Para contrariar este anómalo estado de coisas é absolutamente necessário forjar uma verdadeira alternativa política. Todavia, não pode ser o actual Presidente da República a fazer esse papel, ainda que lhe caiba a importante missão de conter os devaneios e os excessos socráticos, exercendo uma apertada vigilância nos actos do Governo, exigindo o cumprimento da normas constitucionais, as quais, na verdade, jurou defender, cumprir e fazer cumprir.
Veremos se a chamada sociedade civil conseguirá sair da presente letargia, que tanta desmotivação vai produzindo, tanto fatalismo, conformismo e, por fim, geral submissão, afogando as esperanças de todos numa regeneração política, sempre evocada, mas constantemente adiada.
Ânimo, pois, para todos os Portugueses de são juízo e de firme carácter, neste ano de 2009, que, nem por se apresentar tão pouco auspicioso, deve ser tomado sem esperança, antes mais uma razão ele nos dá para suscitar a imaginação, a aplicação no trabalho e a vontade de enfrentar e vencer as dificuldades que se avizinham.
Basta lembrar que atrás do tempo, tempo vem.
No fundo, se este vai ser um ano difícil, sempre poderemos perguntar para quem foi fácil o ano que findou, excluindo obviamente a consabida casta financeira que bem democraticamente se tem regalado com a desregulação económica, até há pouco erigida em condição suprema da competitividade das Empresas, no mundo inteiro ?
Aguardam-se opiniões e, sobretudo, acções.
AV_Lisboa, 04 de Janeiro de 2009